NOTÍCIAS
Artigo – O que um incêndio numa serventia pode ensinar sobre segurança da informação
19 DE MAIO DE 2022
O que aconteceu?
Em 4/5/2022, um incêndio criminoso destruiu 90% do acervo do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelionato de Notas da comarca de Itapemirim, no Espírito Santo. Segundo a Polícia Civil, o objetivo era encobrir evidências de uma investigação em andamento.
Embora as inegáveis perdas materiais, o acervo felizmente não foi perdido, na medida em que a serventia contava com backup duplo e em nuvem. Nesse contexto, vale a pena refletir sobre a importância da segurança da informação para as serventias extrajudiciais.
Por que é tão importante a segurança da informação nos cartórios?
Desde antes da vigência da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o sistema notarial e registral conta com regulação sobre segurança da informação, feita por meio do Provimento nº 74/2018, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Nele, são elencadas uma série de medidas técnicas e administrativas, tais como política de segurança da informação, plano de continuidade, backup, firewall, proxy, antivírus, nobreak, etc.
A plena adequação ao Provimento 74 custa empenho e investimento. Diante disso, é comum o questionamento sobre a real necessidade de tantas salvaguardas. “Nem no Fórum tem tanta coisa!”, é o que se costuma ouvir dos amigos delegatários, ao comentarem tais exigências.
Isso é simples de responder. O nível de segurança deve ser proporcional ao risco do tratamento de dados, aferido pela relevância, natureza e volume dos dados tratados, a saber:
1) Relevância: os dados conservados pelas serventias são de interesse público e albergam, em seu conteúdo, muitos direitos subjetivos. São de alta relevância para o Estado e para as pessoas em geral;
2) Natureza: muitos dos dados são de natureza sigilosa ou sensível, exigindo proteção em nível diferenciado;
3) Volume: o banco de dados é sempre volumoso. Nas empresas, a regra é descartar o máximo possível e guardar apenas o que for realmente útil. Nos cartórios, a regra é conservar tudo e descartar apenas o que for obrigatório.
Essas considerações já são suficientes para percebermos que é justificada a segurança da informação em níveis mais elevados.
Mas o simples raciocínio é que nada se comparado aos fatos. São nos momentos difíceis que a necessidade de segurança se torna mais vívida. Neles, faz todo sentido a máxima segundo a qual a segurança da informação é sempre excessiva, até o momento em que ela é insuficiente.
O incêndio na serventia de Itapemirim é certamente um desses momentos que nos colocam a pensar. Nesse texto, comentaremos dois pontos importantes da estrutura de segurança prescrita no Provimento 74.
Backup
O artigo 3º do Provimento 74 determina que cada serventia possua o backup (cópia de segurança) de todo o acervo, feito de duas formas: 1) em mídia eletrônica (ex: HD externo); 2) em formato digital, que é o backup em nuvem. A respeito, valem duas observações.
A primeira é que o backup deve ser feito todo dia, pois se o cartório perder seu acervo físico num desastre, será capaz de reestabelecer as atividades sem grandes perdas.
A segunda é que não basta existir um procedimento de backup. É importante que ele seja comprovadamente eficaz.
Isso acende um aleta para os contratos com fornecedores de serviços em TI. Suponhamos que o fornecedor garanta contratualmente que faz o backup diário, mas nunca faz testes disso. E se o backup estiver corrompido há muito tempo? Na hora de um incidente, provavelmente o acervo será prejudicado.
É claro que o responsável pela serventia tem direito a reparação dos danos. Mas isso resolve o problema?
Para evitar essa situação, é muito importante testar periodicamente a integridade dos backups, exigindo o envio periódico de relatórios dessa checagem ao encarregado de dados da serventia.
Este deve analisá-las e avaliar sua eficácia prática, munindo o responsável pela serventia de informações precisas para que tome as decisões mais acertadas a fim de conservar o acervo.
Plano de continuidade de negócios
Para além do backup, o Provimento 74 prevê que os meios de armazenamento utilizados deverão contar com recursos de tolerância a falhas. Isso evidencia a essencialidade de ter um plano B se algo falhar. Trata-se do Plano de Continuidade de Negócios (PCN).
Previsto no artigo 2º, inciso I do Provimento 74/CNJ, o PCN é a listagem dos incidentes que possam afetar o acervo e impedir a prestação dos serviços. Tais eventos podem ter causas naturais, técnicas e humanas, estas últimas intencionais ou não. São exemplos: pane elétrica, infecção por malware, furto, enchente, incêndio, sequestro de dados, dentre outros.
Tendo em mãos esse mapeamento de possíveis desastres, a serventia pode antecipar as medidas a serem tomadas em caso de sua ocorrência. Assim, traça-se um guia de como agir diante de cada contexto.
Com um plano desenhado de antemão — longe do stress e da pressão do incidente — a serventia possui muito mais condições de agir em situações emergenciais, pois todo esforço de planejamento já foi feito. Logo, o PCN permite ações rápidas de contenção de danos, garantindo a continuidade da atividade sem interrupção, como determina o artigo 7º do Provimento 74.
Ao contrário, não ter um PCN exige do delegatário um planejamento feito às pressas, no calor do momento. E fatalmente o tempo de recuperação do acervo é elevado, prejudicando o faturamento da serventia e a continuidade da prestação do serviço aos usuários.
Por fim, é preciso frisar algo muito importante: o PCN deve ser escrito.
Quando as leis e regulamentos utilizam os termos “política” ou “plano”, com isso querem dizer algo escrito, documentado. É o que se depreende à luz dos padrões de boas práticas em segurança da informação, sobretudo das normas da família ISO 2700. A lógica é simples. Conversas não garantem a segurança necessária para fazer frente aos momentos tensos que seguem a um incidente de segurança.
E isso é perfeitamente compatível com a lógica notarial e de registro. Afinal, se cartórios existem para garantir a segurança jurídica por meio da conservação de atos jurídicos escritos, por que dispensar a segurança da informação proporcionada pelos documentos escritos?
Outras Notícias
Anoreg RS
Legitimação de posse na regularização fundiária urbana: conceito e requisitos
07 de abril de 2022
Após o registro do título, ao invés de se aguardar cinco anos, aguarda-se dez anos para a conversão da posse em...
Anoreg RS
Manobra que aumenta arrecadação do ITBI está prestes a terminar
07 de abril de 2022
Municípios e o Distrito Federal criaram, há anos, mecanismo invencível que propicia o aumento da arrecadação do...
Anoreg RS
Segunda Seção vai definir em repetitivo a forma de comprovação da mora em contrato de alienação fiduciária
07 de abril de 2022
O relator destacou precedentes dos colegiados de direito privado do STJ no sentido de que, "para comprovação da...
Anoreg RS
Entenda o que é uma Junta Comercial
07 de abril de 2022
Aprenda o que é e como funciona a Junta Comercial, tire suas dúvidas sobre esse órgão. Se mantenha informado!
Anoreg RS
Formas de reconhecimento de paternidade presentes no código civil
07 de abril de 2022
Nessa linha de pensamento, ultrapassou-se a ideologia em que a presunção de paternidade era apenas quando os...